25.10.2021

A importância da estratégia - e seu diferencial - na atuação contenciosa

Por Carina Moisés Mendonça

Nós, da área do Direito, aprendemos, desde os tempos da faculdade, que o processo depende de impulso das partes, estando o juiz limitado às questões postas e aos pleitos formulados. E, assim, ao longo do estágio e do início da vida profissional, aqueles que se enveredam na atuação contenciosa judicial aprendem o passo a passo do processo judicial, suas fases, os requisitos de cada uma delas e, claro, os prazos para cada manifestação processual. Muitas vezes, então, entra-se no cumprimento “automático” do processo, passando a atuar de forma muito mais reativa do que (pró)ativa.

O mesmo comportamento reativo, às vezes, é observado antes mesmo do início do processo. Ao ser procurado pelo cliente com um problema específico, o advogado que atua no âmbito judicial, instintivamente, já pensa em qual processo ajuizar e qual pedido fazer ao final da petição inicial e, na sequência, envia proposta para assim proceder.

Essa é a maneira com que muitos profissionais que atuam em processos judiciais tornam-se meros cumpridores de prazos, pensando pontualmente, diante da intimação recebida, o que peticionar, esquecendo-se de – ou, às vezes, não sabendo – olhar novamente a situação posta no início em um novo momento, diante de novos fatos e/ou outras possibilidades.

E é aí que se perde a eficiência e a possibilidade de atingir o objetivo final buscado pelo advogado: solucionar o problema do cliente, de forma rápida, eficaz, segura e menos onerosa possível! E não só isso, mas, principalmente, a possibilidade de fazer diferente e melhor.

É preciso “sair do automático”!

E o que seria esse “sair do automático” na atuação contenciosa? É ter estratégia!

Vale, aqui, transcrever o significado de “estratégia” no dicionário[1]:

es·tra·té·gi·a
sf
1 MIL Arte de planejar e coordenar as operações das forças militares, políticas, econômicas e morais envolvidas na condução de uma guerra ou na preparação da defesa de um Estado ou comunidade de nações.

2 MIL Arte militar que se ocupa do equacionamento tático das operações e movimentações de um exército tendo em vista conquistar uma vitória ou lograr condições vantajosas para vencer um inimigo.

3 POR EXT Arte de utilizar planejadamente os recursos de que se dispõe ou de explorar de maneira vantajosa a situação ou as condições favoráveis de que porventura se desfrute, de modo a atingir determinados objetivos.

4 POR EXT Manobra ou artifício engenhoso; ardil, subterfúgio, estratagema.

Conclui-se que ter estratégia é, antes de tudo, ter planejamento! E por que não dizer que, assim como no sentido militar acima transcrito, em um processo judicial a estratégia também consiste na arte do “equacionamento tático das operações e movimentações…tendo em vista conquistar uma vitória ou lograr condições vantajosas para vencer um inimigo”. O processo é uma batalha com dois ou mais combatentes e um resultado ao final (vitória, derrota ou empate).

Dessa forma, absolutamente tudo deve ser analisado, organizado e planejado ao profissional ser consultado e contratado para resolver um problema posto pelo cliente no imbróglio com outra parte: desde o timing para a propositura da ação, as vantagens ou riscos de se tentar uma composição antes do ajuizamento, a efetividade e/ou necessidade de uma notificação extrajudicial anterior, a decisão de recorrer ou não e da sua utilidade, de se tentar um acordo ou não e o momento certo para isso, até, e principalmente, a efetividade, ao final, se sair vencedor do processo para que não incorra no famoso “ganhar mas não levar”.

E na análise da efetividade do processo não se está falando apenas na possibilidade da outra parte pagar ou não a condenação, mas do seu pedido, que pode ter natureza de fazer, não fazer ou pagar, ainda ser útil ao cliente, considerando o tempo de trâmite processual.

Não raro, ao ajuizar o processo judicial, aquele provimento interessa e será útil ao cliente, mas, com o passar do tempo e novos acontecimentos no campo fático, deixa de ser. Ainda assim, no movimento “automático”, dá-se sequência ao processo, cumprindo os prazos e recorrendo para, ao final, perceber que deixou de existir o interesse processual que motivou a distribuição da ação. Mas daí pode ser tarde, pois, mesmo não mais lhe interessando determinado provimento, se sair perdedor estará obrigado ao pagamento de honorários e custas.

Mas não é só. A estratégia deve estar presente também na construção das petições; nos argumentos que serão utilizados; no que deve ser, de pronto, exposto na peça vestibular e na defesa; no que esperar de contra-argumento; em quais elementos e teses utilizar em réplica; em quais preliminares arguir e que serão benéficas se acolhidas. Aqui darei um exemplo prático, já que colegas de profissão que lerão esse artigo pensarão: ora, qualquer preliminar que eu alegue e que seja acolhida será benéfica. Não necessariamente! Será “benéfica” no aspecto processual (o juiz acolheu um dos meus argumentos), mas talvez não no campo fático, no campo real.

Exemplo: parte contrária distribuiu o processo em foro (comarca) que não tem competência territorial e, portanto, a competência é relativa, segundo normas do Código de Processo Civil. De pronto, já se tem uma primeira preliminar. Ocorre que, se acolhida a minha exceção de incompetência, o processo será remetido para uma comarca menor em que o trâmite dos processos é muito mais lento, o que pode significar anos a mais de pendência judicial. Ou, ainda, para uma comarca em que sabidamente a postura do juiz é favorável à tese da exordial. Esse é só um exemplo dentre tantos outros, como em casos de impugnação ao valor da causa.

O planejamento, pensando sempre no todo fático – e não só processual – e tendo sempre em mente resolver o problema do cliente de forma segura, eficaz, mais célere e menos onerosa, é o que faz o diferencial na atuação de um advogado que não só milita na área contenciosa, mas em todas as áreas. Contudo, na atuação contenciosa, a estratégia, muitas vezes, não é empregada, exatamente pelo rito processual que somos ensinados desde a faculdade a seguir e que pode levar a não “pensar fora da caixa”, ou seja, a não pensar em novas soluções para os mesmos problemas.

É preciso, cada vez mais, no mundo dinâmico dos negócios, entregar soluções rápidas e efetivas e, para isso, muitas vezes, apenas técnica jurídica não é suficiente. É necessário o pensamento estratégico e “sentir a dor do cliente” para propor os melhores caminhos para resolução do que o aflige.

Carina Moisés Mendonça é sócia da TMB Advogados, integrante do time Contencioso Cível, graduada pela Pontifícia Universidade Católica de Campinas e pós graduada pela Fundação Getúlio Vargas.

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[1] Dicionário Brasileiro da Língua Portuguesa Michaelis (https://michaelis.uol.com.br/palavra/a2zb/estratégia)

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