30.08.2021

A responsabilidade pela distribuição de cartas precatórias

Por João Victor Junqueira Aranha

A carta precatória é uma ferramenta utilizada pelos órgãos julgadores para que seja estabelecida a comunicação entre os juízos, situados em municípios ou estados diferentes, com a finalidade de que seja cumprido algum ato processual.

Por exemplo, é por meio da carta precatória que um juiz pode requisitar ao outro o cumprimento de um mandado de citação ou penhora, intimação de testemunhas, entre outros.

O entendimento aplicado até então pelo Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo era de que a distribuição de cartas precatórias deveria ser feita exclusivamente pelos advogados, observando somente as seguintes exceções: cartas expedidas em processos criminais, infância e juventude, de interesse do Ministério Público ou Defensoria Pública ou processos de juizado especial cível em que não haja patrono constituído.

Tanto é que, em abril de 2021, em mais um Procedimento de Controle Administrativo (PCA) proposto pelo município de Votuporanga, o Conselho Nacional de Justiça (CNJ) não conheceu do pedido e manteve o entendimento de que as cartas precatórias devem ser distribuídas por advogados, ressalvadas as exceções mencionadas.

Em sede recursal, o município alegou que a matéria ainda não havia sido superada, tendo em vista que o próprio STJ havia proferido um entendimento totalmente diferente daquilo que vinha sendo aplicado aos casos concretos.

O julgamento do Recurso Especial nº 1.817.963/RS serviu como paradigma e resultou na alteração do sentido das decisões sobre os questionamentos relacionados à distribuição de cartas precatórias em geral, num caso claro de evolução jurisprudencial.

Em resumo, o STJ decidiu que não há justificativa legal para que a parte interessada não só tenha que pagar, como também providenciar a distribuição da carta precatória, o que se mostra como uma exigência incabível. O trecho abaixo destacado ilustra, de forma sucinta, os motivos que formaram o conhecimento dos julgadores do recurso:

“Outrossim, a parte, por não integrar o Judiciário, não possui – e nem poderia ter – competência legal, nem ingerência administrativa na serventia judicial para expedir, por ela própria, cartas precatórias, sobretudo diante da crescente hegemonia nacional dos processos eletrônicos, os quais são impulsionados por sistemas digitais manejados exclusivamente pelos servidores públicos de cada Tribunal”.

Vale dizer que as decisões que se seguiram ao Recurso Especial nº 1.817.963/RS adotaram tal orientação e consolidaram o entendimento no tocante à responsabilidade por distribuição de cartas precatórias, o que forçou a mudança da cognição empregada pelo CNJ.

Assim, a partir do julgamento do recurso administrativo interposto pelo município de Votuporanga/SP, o CNJ determinou que o Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo se abstenha de exigir dos advogados constituídos e dos defensores dativos que distribuam as cartas precatórias.

Desta maneira, nos resta claro que a mudança de entendimento por parte do CNJ ocorreu em razão da alteração do cenário fático como um todo. Isso é uma consequência direta da popularização do processo eletrônico e de uma incompatibilidade de funções, sendo atribuído aos servidores públicos que procedam com a distribuição das cartas precatórias, afastando este ônus das partes que já suportam os gastos econômicos para promover tal medida.

João Victor Junqueira Aranha é advogado do time do Contencioso Cível da TMB Advogados.

Open chat
Olá. Como podemos te ajudar?