08.08.2022

Cláusula Arbitral nos Títulos Executivos: Consequências Jurídicas

Por Luiza Gregori Porto e Lucas Rampelotto Balbino

Conforme os dados divulgados em 2018 pela Central de Custódia e de Liquidação Financeira de Títulos Privados, o agronegócio movimentou mais de R$100 bilhões em títulos de créditos. Diante do vultoso valor transacionado, questões como a segurança jurídica e celeridade de sentenças tornam-se cada vez mais relevantes no cenário nacional.

Diante dessas demandas, a arbitragem apresenta-se como uma das principais ferramentas para obter decisões rápidas e especializadas no contexto complexo que envolve o dia a dia da cadeia econômica-produtiva do agro brasileiro.

Assim sendo, salta-se uma série de questionamentos, dentre eles; caberia a Arbitragem em Ações de Execução fundadas em Títulos Extrajudiciais? Em caso afirmativo, qual seria sua utilidade e vantagens no decorrer dos atos executórios?    

A arbitragem está devidamente regulamentada pela Lei nº 9.307/96 e, assim como os negócios jurídicos firmados em geral, é regida pelo Princípio da Autonomia da Vontade das partes. Dessa forma, os contratantes podem pactuar a utilização de Câmaras Arbitrais, através de Clausulas Compromissórias, a fim de resolver litígios decorrentes das relações contratuais, ao longo do tempo, como forma alternativa de resolução de conflitos, sem a submissão ao Poder Judiciário.    

Nesse ínterim, a cláusula compromissória deve estar de acordo com o disposto no caput do artigo 1º da Lei de Arbitragem Brasileira, que limita o poder arbitral para tratar, exclusivamente, de direitos patrimoniais disponíveis. Além da limitação da matéria, cumpre ressaltar que os árbitros são desprovidos de poderes coercitivos e, consequentemente, não são investidos do poder de praticar atos executivos, fato que, para que haja uma sentença arbitral válida e eficaz, somente sujeita à arbitragem discussões meritórias.    

As ações de execuções, para que sejam válidas, devem estar fundamentadas em obrigações certas, líquidas e exigíveis, conforme disposto no artigo 783 do Código de Processo Civil, inseridas em títulos executivos extrajudiciais, que possui um rol taxativo elencado no artigo 784 seguintes.   

Nesse ponto, cumpre ressaltar o entendimento do doutrinador Carlos Alberto Carmona, que preleciona que “não há, porém, incongruência alguma entre a existência de um título executivo e a possibilidade de arbitragem, mas a correlação entre os temas deve ser bem compreendida: se houver alguma dúvida sobre o título (ou sobre as obrigações ali consignadas), tal crise de certeza deve ser dirimida pela via arbitral; mas se houver inadimplemento, o credor socorrer-se-á desde logo da via judicial, propondo demanda de execução, sem que haja espaço para a arbitragem”.    

Corroborando com esse entendimento, o Superior Tribunal de Justiça, ao julgar o Recurso Especial Cível nº 1.465.535, entendeu que, em contratos de títulos executivos extrajudiciais com cláusulas compromissórias, há limitação da matéria objeto da apreciação do magistrado, já que o juiz estatal não tem competência para resolver as controvérsias que digam respeito ao mérito dos Embargos à Execução. As questões atinentes ao título ou as obrigações ali consignadas e as matérias que foram eleitas poderão ser solucionadas pela instância arbitral.  

Ainda nesse sentido, a I Jornada de Prevenção e Solução Extrajudicial de Litígios do Conselho da Justiça Federal entendeu que “a existência de cláusula compromissória não obsta a execução de título executivo extrajudicial, reservando à arbitragem o julgamento das matérias previstas no art. 917, incisos I e Vi, do CPC/2015”.    

A título de esclarecimento, após o ajuizamento de Ação de Execução de Título Extrajudicial, as partes possuem o direito de contraditório e ampla defesa e, no caso, o devedor terá direito de se defender através da oposição dos Embargos à Execução.  Ocorre que os Embargos possuem natureza de Ação de Conhecimento, ou seja, poderá ser discutido o mérito, fato utilizado pelos devedores contumazes para trazer morosidade à ação.    

Diante da cláusula arbitral inserida no título, tem-se uma barreira para evitar essas medidas protelatórias no decorrer da execução, já que o devedor terá de utilizar a Câmara Arbitral convencionada para resolver a questão suscitada por ele. Dessa maneira, ainda que o devedor tente utilizar o judiciário para resolver questões previamente acordadas que seriam resolvidas por arbitragem, a demanda poderá ser extinta, visto o impedimento do magistrado de apreciar o seu mérito.  

Devido à obrigatoriedade de utilizar a arbitragem, não restam dúvidas que uma das principais vantagens da arbitragem na Ação de Execução, especialmente para os credores, seria a celeridade em reaver os créditos executados, uma vez que medidas protelatórias seriam sopesadas pelos altos valores dispendidos pela arbitragem, além da celeridade em que os litígios são resolvidos pelos árbitros, bem como o domínio técnico sobre a matéria que os árbitros indicados pelas partes terão.    

Contudo, caso haja a real necessidade de discussão e suspensão da execução, o devedor poderá valer-se do artigo 22-A da Lei de Arbitragem, que prevê a possibilidade de as partes utilizarem o Judiciário para concessão de medidas cautelares ou de urgência, cuja eficácia fica cessada em 30 dias caso a parte interessada não requerer a instauração da arbitragem.

Além disso, questões atinentes ao próprio processo ou excesso de execução poderão ser alegadas perante o Poder Judiciário, não cabendo ao árbitro as discutir.  Assim sendo, para devedores que não buscam dilatar o processo, não há em que se falar em inacessibilidade à justiça, tendo em vista a matéria limitada que cabe ao árbitro arguir e a possibilidade de ter, pelo próprio judiciário, medidas pontuais para sanar problemas antes de utilizar-se da arbitragem.

Portanto, Cláusulas Compromissórios podem ser utilizadas em Ações de Execuções de Títulos Extrajudiciais, bem como trazem os seguintes benefícios: (i) atribuem maior celeridade, eis que evitam medidas protelatórias e sentenças arbitrais possuírem resultados irrecorríveis, também (ii) trazem uma melhor análise jurídica e econômica do litígio e do direito. 

Luiza Gregori Porto é advogada, graduada pela Universidade Presbiteriana Mackenzie e Lucas Rampelotto Balbino é estagiário, graduando pela Pontifícia Universidade Católica de Campinas, ambos integrantes da equipe do time Contencioso Cível da TMB Advogados.

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