16.11.2020

Conselhos de Classes: uma indefinição para as empresas

Por Raphaela Kaizer

A exemplo do que temos visto nas indústrias cerâmicas, que têm sido obrigadas a fazer o registro junto ao CREA mesmo já estando registradas no Conselho dos Químicos, não são poucas as empresas, dos mais diversificados ramos, que recebem de outros órgãos a exigência da inscrição. Isso ocorre pois estes entendem que essas exercem atividades que estão dentro de seu campo de fiscalização, exigindo, inclusive, a contratação de profissionais, a princípio dispensáveis de acordo com a atividade exercida.

Acontece que essas empresas já estão inscritas naqueles conselhos que guardam efetiva relação com suas atividades preponderantes. Porém, com a exigência imposta, passam a ser obrigadas a se inscreverem em mais de um conselho, os quais muitas vezes detém regras conflitantes entre si, sem falar no custo de contratação do profissional habilitado.

O registro em órgãos de fiscalização profissional tem por pressuposto a atividade básica exercida pela empresa, ou seja, o critério legal para a obrigatoriedade de registro perante os conselhos profissionais. A consequente contratação de profissional de qualificação específica é determinada pela atividade básica ou pela natureza dos serviços prestados.

Porém, o que se tem visto são esses órgãos exigindo que as empresas se inscrevam junto a eles mesmo não tendo uma atividade exclusiva vinculada àquele conselho.

Como exemplo, temos o Conselho de Engenharia e Agronomia que advoga a tese de que as atividades exercidas por indústrias cerâmicas, de materiais plásticos, dentre outras, devem ter engenheiros em seu quadro de funcionários/contratados, entendendo que as atividades desenvolvidas são exclusivas desses profissionais.

No caso das indústrias cerâmicas, em específico, a alegação do CREA é que a manipulação química dos esmaltes e outros processos realizados são de competência exclusiva de engenheiros.

Ocorre que, no entanto, tais manipulações estão entre as atividades desenvolvidas também por um técnico químico e portanto não são restritas à atuação de um engenheiro químico. Isso dá às empresas a iniciativa de escolha sobre ter um técnico químico ou um engenheiro químico frente a essas atividades, podendo estar vinculadas ao Conselho dos Químicos ou ao CREA, respectivamente.

Porém, mesmo diante de tais argumentos e evidências, o CREA insiste em fiscalizar e autuar, impondo multas por falta de registro e exigindo o pagamento de anuidade, além da contratação de um engenheiro devidamente habilitado.

Face a estas situações, as empresas estão sendo obrigadas a levar a discussão até o judiciário de forma a não serem compelidas ao registro junto ao CREA e de garantir que sigam registradas junto ao CRQ, mantendo em seu quadro de funcionários/contratados o técnico químico responsável pela manipulação dos produtos realizados em sua atividade.

O Tribunal Regional Federal da 3ª Região, órgão responsável pelos julgamentos federais do Estado de São Paulo em segunda instância, já se manifestou algumas vezes favoravelmente às teses das empresas, entendendo que as manipulações exercidas pelas indústrias cerâmicas não são atividades exclusivas de engenheiros.

Com essas decisões, as empresas têm como garantida a manutenção do registro junto ao CRQ e podem manter técnicos como responsáveis pelas manipulações dos químicos.

A maioria das decisões até agora proferidas entendem que, comprovada que a atividade básica da empresa consiste da “fabricação e comercialização de produtos cerâmicos”, excluída estará a obrigatoriedade de registro junto ao CREA, uma vez que tais atividades não estão inseridas no rol das atividades privativas de engenheiro, arquiteto ou engenheiro-agrônomo.

Entendem, ainda, que as Resoluções do Conselho Federal de Engenharia e Agronomia (CONFEA) são arbitrárias e ilegais e não têm o condão de impor obrigatoriedade de registro às indústrias de “fabricação e comercialização de material cerâmico”.

Porém, há uma ressalva àquelas indústrias cerâmicas que exercem também atividade de extração de argila, ou seja, que não se limitam à fabricação e comercialização de produtos cerâmicos.  De acordo com a jurisprudência, a lavra/extração da argila estaria entre as atividades do campo de abrangência exclusiva do CREA e, portanto, devendo manter em seu quadro um engenheiro devidamente habilitado para esse fim.

Logo, podemos concluir que essa celeuma está longe de terminar, pois os órgãos continuarão a exigir o registro das empresas. A estas caberá comprovar que não exercem as atividades privativas a determinado conselho, podendo, portanto, escolher aquele que melhor lhe prouver, desde que mantenha relação com a atividade exercida.

Raphaela Kaizer é advogada do time Tributário da TMB Advogados.

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