04.04.2022

Medida provisória regulamenta o teletrabalho e altera regras do auxílio alimentação

Por Flávio Henrique Berton Federici

No dia 28 de março de 2022, foi publicada a Medida Provisória nº 1.108, que dispõe sobre o pagamento de auxílio alimentação, bem como traz inovações quanto à regulamentação do teletrabalho, modalidade que se difundiu exponencialmente durante a pandemia e se tornou hoje uma realidade em grande parte das empresas ao redor do mundo, nos mais diversos segmentos econômicos.

Abaixo, trataremos em tópicos distintos cada uma das alterações e os aspectos legais envolvidos, lembrando que, num prazo de quatro meses, essa medida precisa ser votada no Congresso Nacional, sujeita, inclusive, a alterações.

1) Teletrabalho

O teletrabalho já possui previsão na Consolidação das Leis do Trabalho desde que entrou em vigor a chamada reforma trabalhista, no final de 2017. Contudo, principalmente com a pandemia, essa modalidade de trabalho remoto ganhou vital importância, bem como valorização, conquistando novos adeptos em grande parte das atividades econômicas.

A MP 1.108 alterou o artigo 75-B da CLT, que anteriormente continha apenas parágrafo único e passou a contar, agora, com nove, conforme abaixo transcrito:

“Art. 75-B. Considera-se teletrabalho ou trabalho remoto a prestação de serviços fora das dependências do empregador, de maneira preponderante ou não, com a utilização de tecnologias de informação e de comunicação, que, por sua natureza, não se configure como trabalho externo.

§ 1º O comparecimento, ainda que de modo habitual, às dependências do empregador para a realização de atividades específicas, que exijam a presença do empregado no estabelecimento, não descaracteriza o regime de teletrabalho ou trabalho remoto.

§ 2º O empregado submetido ao regime de teletrabalho ou trabalho remoto poderá prestar serviços por jornada ou por produção ou tarefa.

§ 3º Na hipótese da prestação de serviços em regime de teletrabalho ou trabalho remoto por produção ou tarefa, não se aplicará o disposto no Capítulo II do Título II desta Consolidação.

§ 4º O regime de teletrabalho ou trabalho remoto não se confunde e nem se equipara à ocupação de operador de telemarketing ou de teleatendimento.

§ 5º O tempo de uso de equipamentos tecnológicos e de infraestrutura necessária, e de softwares, de ferramentas digitais ou de aplicações de internet utilizados para o teletrabalho, fora da jornada de trabalho normal do empregado não constitui tempo à disposição, regime de prontidão ou de sobreaviso, exceto se houver previsão em acordo individual ou em acordo ou convenção coletiva de trabalho.

§ 6º Fica permitida a adoção do regime de teletrabalho ou trabalho remoto para estagiários e aprendizes.

§ 7º Aos empregados em regime de teletrabalho aplicam-se as disposições previstas na legislação local e nas convenções e acordos coletivos de trabalho relativas à base territorial do estabelecimento de lotação do empregado.

§ 8º Ao contrato de trabalho do empregado admitido no Brasil que optar pela realização de teletrabalho fora do território nacional, aplica-se a legislação brasileira, excetuadas as disposições constantes na Lei nº 7.064, de 6 de dezembro 1982, salvo disposição em contrário estipulada entre as partes.

§ 9º Acordo individual poderá dispor sobre os horários e os meios de comunicação entre empregado e empregador, desde que assegurados os repousos legais.”

Destacamos que a nova regulamentação trazida pela MP reconhece o chamado “sistema híbrido” ao alterar o caput do artigo 75-B, constando que o teletrabalho é aquele que ocorre fora das dependências do empregador “de maneira preponderante ou não”. Além disso, estabelece que pode ser aplicado também para estagiários e menores aprendizes, dirimindo outro ponto não contemplado expressamente na legislação anterior.

Merecem destaque as modalidades de teletrabalho agora tipificadas por produção ou tarefa (em que não há horário de trabalho definido pelo empregador, mas sim um número de tarefas ou atividades a serem entregues, portanto, sem necessidade de controle de início e fim do dia de trabalho) ou por jornada (nesse caso, sim, o empregador que contar com mais de 20 colaboradores deverá estabelecer em contrato a forma de controle e de comunicação, que pode se dar através de planilhas, login ou logoff em sistemas, dentre outros meios, tanto para horário de início e término, quanto para os intervalos). Em ambos os casos, faz-se necessária a concessão de uma folga semanal remunerada.

Mais um ponto que ficou expresso na legislação se refere à norma coletiva de trabalho aplicável, que será aquela correspondente à “base territorial do estabelecimento de lotação do empregado”, inclusive para colaboradores contratados para executar suas atividades fora do país.

Ainda, a norma deixa claro que o uso dos equipamentos destinados ao teletrabalho fora da jornada do empregado não caracterizará tempo à disposição, o que, em nosso entendimento, confere maior segurança jurídica a esta modalidade, minimizando o receio de caracterização de algum tipo de sobreaviso.

Não houve alteração do artigo 75-D da CLT, razão pela qual entendemos que permanece a regulamentação anterior, no sentido de que as disposições sobre responsabilidade de aquisição, manutenção ou fornecimento dos equipamentos e infraestrutura necessária e adequada à prestação do trabalho remoto, bem como custos, continua sendo algo a ser acordado entre empregador e empregado, com previsão em contrato de trabalho.

Da mesma forma, não foi alterado o artigo 75-E, que estabelece que o “empregador deverá instruir os empregados, de maneira expressa e ostensiva, quanto às precauções a tomar a fim de evitar doenças e acidentes de trabalho”, razão pela qual é recomendável que tais instruções, inclusive, constem formalizadas em documento próprio.

2) Auxílio Alimentação

Quanto às alterações atinentes ao auxílio alimentação, a norma determina que tal benefício seja destinado exclusivamente ao pagamento de refeição ou à aquisição de gêneros alimentícios no comércio.

Observa-se que as novas disposições são destinadas primordialmente à contratação pelos empregadores junto às empresas fornecedoras do serviço, vedando expressamente que haja cobrança de taxas negativas ou descontos às empresas beneficiárias, que recebem isenção fiscal para implementar os programas junto aos funcionários. O objetivo é garantir que os recursos não sejam usados para outros fins, que não a compra de alimentos, dado o tratamento tributário diferenciado atribuído ao benefício.

Essas disposições não se aplicam aos contratos vigentes até o seu vencimento (na prorrogação as novas regras deverão ser observadas), num prazo máximo de 14 meses contados na entrada em vigor da Medida Provisória, sob pena de multa que pode chegar a R$ 50.000,00.

Consideramos que as alterações legais trazidas com a MP 1.108 trarão maior segurança jurídica às relações de trabalho, sensivelmente impactadas com a pandemia, o que demandou necessidade de modernização desta legislação. Resta aguardar os trâmites perante a Câmara e Senado Federal.

Flávio Henrique Berton Federici é sócio gestor do time Trabalhista da TMB Advogados, Graduado e Pós-graduado pela Pontifícia Universidade Católica de Campinas.

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