03.11.2020

Você tem o melhor contrato?

Por Daniela A. Pozzetti

Se podemos enxergar um ponto positivo, em meio a tantos impactos negativos que esta pandemia nos tem feito sentir, ele seria: empatia, ou seja, a capacidade de compreender ou de se colocar na situação de outrem.

Temos visto inúmeras atitudes de conhecidos e desconhecidos que, entendendo a situação de maior vulnerabilidade de alguns, têm ajudando ao próximo com compaixão e sincero desejo de que tudo dê certo.

Mas o que isso tem a ver com o nosso tema? Tudo!

O contrato é, para uma sociedade, o veículo pelo qual as partes estabelecem e acordam aquilo que entendem por justo e correto. Podemos dizer que o contrato tem, dentre inúmeras funções, aquela que chamamos de “função social”.

Não estamos falando daquela função social de ajuda ao próximo, mas sim de uma função social maior, que atinge todo sistema econômico e social de um país.

Sim, não pense você, empresário, que o seu contrato não é capaz de produzir efeitos para além de sua empresa e pessoa.

Na verdade, ele pode refletir e repercutir em toda cadeia econômica do país. Já imaginou se um agricultor não honrasse com o plantio da safra, não realizasse a colheita e nem a entregasse ao comprador, seja ele brasileiro ou estrangeiro? Ou, então, já pensou sobre se o prestador de serviços de manutenção de ar condicionado de sua empresa, não executasse os serviços ou o fizesse sem a observação das normas técnicas? Você conseguiria seguir sua meta de negócio sem ser afetado? E vou mais além: já refletiu sobre o simples contrato de trabalho doméstico que tem com sua funcionária? Se ela se ausentasse ou não o cumprisse da forma combinada, qual seria o impacto?

Pois então. Consegue perceber que o contrato deve cumprir uma função social, onde a mais importante delas, é a econômica? Aquela, que gera riquezas desde a simples pessoa natural, até à maior das pessoas jurídicas (empresa)?

Para que tudo isso transcorra bem, existe uma palavra técnica para “empatia”, que é ra-zo-a-bi-li-da-de.

Razoabilidade é o que é sensato, de bom senso, de boa-fé, transparente, sem pegadinhas ou proposições mal-intencionadas. É entender as circunstâncias externas que geraram a contratação (chamamos de base objetiva do negócio) e as expectativas de cada uma das partes (chamamos de base subjetiva do negócio) e fazer-se respeitar e cumprir as vontades das partes.

E, para aqueles que só acreditam quando “a lei diz” (nós, juristas, denominamo-los de “aqueles juspositivistas do direito, adeptos à Teoria Pura do Direito de Hans Kelsen”), digo-lhes o seguinte:

O bom senso e a razoabilidade estão no ordenamento jurídico expressamente. Tais como nos seguintes:

a) Artigo 3º da Constituição Federal, que diz que: “Constituem objetivos fundamentais da República Federativa do Brasil: I – construir uma sociedade livre, justa e solidária; (…)”;

b) Artigo 421 Código Civil, que estabelece que: “A liberdade contratual será exercida nos limites da função social do contrato”;

c) E, especialmente, no artigo 422 do Código Civil, que prevê: “Os contratantes são obrigados a guardar, assim na conclusão do contrato, como em sua execução, os princípios de probidade e boa-fé”.

Está tudo interligado em nosso sistema jurídico. Notou que o legislador falou expressamente em boa-fé?

E não é qualquer “boa-fezinha” que se exige. Em contratos, exige-se aquela boa-fé firme, clara, objetiva, que respeita o bom senso, que gera o “ganha-ganha”. Aquela que vai desde o início de uma contratação (como uma conversa no telefone, por exemplo), passa pela duração do contrato (como no caso de um prestador de serviço usar sua melhor técnica para execução dos trabalhos contratados, executando-o como se para si próprio fosse) e se completa com a finalização do contrato, tendo os seus efeitos prorrogados até mesmo após o seu encerramento (nós, advogados, chamamos de responsabilidade civil pós contratual).

E isso não significa que temos que ser “bonzinhos” em uma negociação ou que não podemos buscar alternativas e vantagens aos nossos clientes. Isso é permitido!

Ao contrário do que se possa pensar, se agirmos com transparência, boa fé e bom senso, conseguiremos criar razoabilidade nas negociações e estabelecer melhores posições, prerrogativas e benefícios aos nossos clientes porque estaremos embasados na lei, nos princípios gerais que regem o direito.

E, em estando nesta posição de correttezza (correção), geraremos maior segurança jurídica aos nossos clientes e, por consequência, agregaremos valor ao seu negócio. Nada teremos a temer quanto ao cumprimento do contrato (sob seu aspecto jurídico de formação), pois ele alcançará o seu destino maior: ser cumprido integralmente pelas partes!

Importante agir dessa forma, inclusive, no momento de fatos e acontecimentos imprevisíveis, inesperados. Entendendo que esses fatos podem atingir uma das partes ou ambas as partes, como no caso de uma pandemia. E, quando e “se” esses acontecimentos ocorrerem, buscar o equilíbrio contratual para que o resultado seja alcançado, para que a intenção das partes no momento da contratação seja mantida e, portanto, para que o contrato tenha a função socioeconômica cumprida ao ter seu objeto, escopo e objetivo entregue, alcançado!

Em palavras simples: agindo, as partes, com o sincero desejo de que tudo dê certo!

Daniela A. Pozzetti é advogada do time de Contratos e Societário da TMB Advogados.

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