31.10.2022

Imposto sobre a renda da pessoa física: você paga de acordo com a sua capacidade?

Por Wellyngton Barella

Na última semana, muito se escutou sobre a possibilidade do fim das deduções de despesas com saúde e com educação na declaração do imposto sobre a renda da pessoa física, informação negada pelo Ministro da Economia, vale ressaltar. Mas, no final das contas, você sabe o quanto essa mudança impactaria no seu bolso?

O imposto sobre a renda deve obrigatoriamente respeitar o princípio constitucional da capacidade contributiva, o qual determina que a pessoa somente deve pagar imposto na medida das suas possibilidades econômicas, ou seja, de acordo com o que possa suportar, respeitando o “mínimo vital” ou o “mínimo indispensável”.

Não é fácil definir o que é “mínimo indispensável”, porém, a Constituição Federal estabelece diretrizes para se chegar a ele quando determina as necessidades básicas de uma pessoa: educação, saúde, alimentação, moradia, transporte e lazer. Assim, “mínimo indispensável” é aquilo que atende as necessidades básicas da pessoa e da família a ela vinculada, devendo a tributação incidir somente sobre o valor que restar disponível após os gastos com a preservação dessas necessidades básicas.

No Brasil, o “mínimo indispensável” é respeitado de forma a fazer com que a pessoa física pague o imposto de acordo com a sua capacidade contributiva?

Segundo estudo do DIEESE – Departamento Intersindical de Estatísticas e Estudos Socioeconômicos, para que fossem assegurados, hoje, os direitos constitucionais de habitação, alimentação, higiene, educação e lazer, a renda mínima média de uma família, composta por dois adultos e duas crianças, deveria ser de R$ 6.306,97/mensais (R$ 75.647,64/anuais). Entretanto, de acordo com a legislação do imposto sobre a renda, a pessoa física que recebe acima de R$ 1.903,98/mensais (R$ 22.847,76/anuais) deverá pagar imposto sobre o valor que ultrapassar esta quantia. Comparação do indicador do DIEESE com o valor previsto na legislação, já percebemos uma primeira distorção: a pessoa física paga imposto sobre o “mínimo indispensável”.

Uma segunda distorção ocorre, justamente, na possibilidade das deduções de despesas.

Podemos dizer que as deduções de despesas para preservação do “mínimo indispensável” estão, basicamente, divididas em dois grupos: (i) as que correspondem aos gastos com a preservação da saúde da pessoa e de sua família e (ii) as que correspondem aos gastos da pessoa e de sua família com moradia, alimentação, educação, lazer, vestuário, higiene e transporte.

Pensamos que vida humana é o bem maior que temos e, por tal razão, sua preservação se mostra imprescindível. As despesas com saúde não podem ser limitadas. Portanto, qualquer ato tendende a limitá-las ou excluí-las deve ser impedido pelo legislador. Contudo, ainda que não haja mudança na legislação atual, atualmente já temos distorções nas deduções com despesas de saúde, uma vez que despesas médicas, hospitalares e com planos de saúde são ilimitadas, mas despesas com medicamentos para tratamentos de doenças crônicas não são. Nos parece inexplicável a regra, num país que não consegue atender a totalidade da população que necessita de medicamentos de uso contínuo.

Com relação às despesas com educação, a legislação permite que seja deduzida para o contribuinte e cada um dos seus dependentes a quantia máxima de R$ 3.561,50/anuais para cada um.

Entendemos necessária a fixação de parâmetros para a dedutibilidade, pois o conceito de “mínimo indispensável” com educação varia de pessoa para pessoa. Entretanto, o problema não está em limitar a dedução, mas nas bases utilizadas para a fixação dos valores. Diante da realidade brasileira, enxergamos, sem maiores esforços, a desproporção do valor permitido, pois é muito difícil se obter educação com R$ 296,71 mensais. Para não dizer impossível.

O mesmo problema ocorre com as despesas referentes aos dependentes. A legislação permite seja deduzida a quantia de R$ 2.275,08, ou seja, R$ 189,59 mensais. Também salta aos olhos a discrepância com a realidade brasileira. Seria possível com esse valor mensal suportar despesas incorridas com uma criança ou um adolescente em relação à alimentação, vestuário, higiene e lazer?

Por fim, vale dizer que as despesas com moradia não podem ser deduzidas. Soma-se a tudo isso, ainda, o fato de os valores não serem corrigidos periodicamente. Por exemplo, os valores das deduções não são corrigidos desde 2015. Evidente, assim, que a legislação, seja limitando, seja impedindo a dedução, não se atenta à realidade enfrentada pelo contribuinte do imposto.

Respondendo a pergunta feita no início deste artigo, podemos dizer que qualquer limitação ou impedimento de dedução de despesas afaterá, sim, o seu bolso. Porém, pode estar certo que, mesmo sem qualquer alteração da legislação neste sentido, você já está contibuindo além da sua capacidade. E não é de hoje!

Wellyngton Barella é sócio da TMB Advogados, integrante do time Tributário, mestrando em Direito Tributário pelo Instituto Brasileiro de Estudos Tributários, pós-graduado em Direito Tributário pela Pontifícia Universidade Católica de Campinas e graduado pela Universidade Metodista de Piracicaba.

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